SERVOS INÚTEIS

Meditando a Liturgia da Palavra do XXVII Domingo do Tempo Comum, ano C

Um dos grandes problemas que põe à prova a nossa fé é o aparente triunfo do mal e dos que o fazem, perante uma suposta incapacidade ou passividade de Deus. Como o profeta Habacuc na primeira leitura, também nós perguntamos: «Até quando Senhor, chamarei por Vós e não me ouvis? Até quando clamarei contra a violência e não me enviais a salvação?». O compromisso da fé exige um esforço constante, onde não há o repouso dos heróis. Contradições de fora, exigências de dentro, põem em risco o êxito final. À vista da grandeza dos probemas e da fragilidade dos nossos esforços, sentimo-nos servos inúteis.

Habacuc 1,2-3;2,2-4, na primeira leitura, profetiza nos tempos em que o Povo de Deus se encontra ameaçado por Nabucodonosor e implora o auxílio do Senhor para a aflição que todos vivem, por causa da ameaça que paira sobre eles. As suas palavras têm perfeita actualidade nestes tempos em que parece que o mal triunfa impunemente, como se Deus não o visse. “O justo viverá pela sua fidelidade”- refere a primeira leitura. Nas dificuldades e provações, o justo fia-se de Deus. Distingue-se pela fidelidade à Palavra. Somos fiéis porque acreditamos. Mas se acredito, não sou herói de nada; se sou fiel, não faço mais do que devo.

À pergunta feita pelo profeta na primeira leitura, ”até quando?”, Deus responde com a chamada à fé e a uma maior atenção para com as suas exigências na vida. Isto mesmo nos diz o Senhor a cada um de nós, quando repetimos as palavras do profeta, no meio das nossas aflições. Disto nos dá a conta o Salmo Responsorial deste Domingo, Salmo 94 (95) 1-2.6-7..8-9.

A nossa vida cristã tem de estar em renovação constante, para sermos fiéis à nossa vocação. S. Paulo que nos aparece na segunda leitura, com a Epístola a Timóteo 1, 6-8.13-14, na qual exorta aquele discípulo a fazer esta mesma renovação. “Deus nos concedeu um espírito de fortaleza”, refere. Fé é a força de Deus. Vence em nós a força das razões e dos sentidos, transporta montanhas. A fé mostra-se nas obras, serva diligente no serviço do seu Senhor. Exige entrega e doação absoluta. A fé é que tem razão. Dela nos vem a lúcida certeza da verdade que não entendo, fundada na evidência do amor que nos fala. A obra suma, o serviço supremo consiste em acreditar na Palavra, na obediência da fé.

A fé é dom gratuito. Perante o mistério que nos ultrapassa, reconheçamo-nos pobres e impotentes. A fé não é um negócio; o amor não tem salário. Não há recompensa, porque não há proporção entre a pobreza dos meus gestos e o peso da glória que nos está destinada. “Com o auxílio do Espírito Santo”, continua S. Paulo, daremos testemunho de Jesus Cristo entre cadeias e contradições.Tudo o que fizermos é força de Deus, obra de Jesus Cristo, que em nós vive e actua. Não te arrogues direitos ou recompensas. A suprema recompensa é a glória de servir.

Depois de ouvir a prece dos Apóstolos para que lhes aumente a fé, Jesus fala-lhes dos prodígios que ela produz em nossas vidas. “Senhor, aumente em nós a fé” – pedem os Apóstolos a Jesus na passagem do Evangelho segundo S. Lucas 17, 5-10, que nos é proposta para este Domingo. O pedido feito ao Senhor pelos Apóstolos, é o grito que se levanta de todo o cristão, inquieto e responsável. Falta de fé é hoje a grande crise da Igreja, da família cristã e de alguns consagrados. Tudo à nossa volta parece ruir, para só ficar a desolação e o cansaço. E quando a fé entra em crise, perde-se o sentido de Deus e o gosto da oração, ficando a alma vazia, sem motivações nem rumo certo. Há um nexo vital entre a fé e a oração. Dependem uma da outra. A oração leva à fé e a fé leva à oração. A oração é a vivência prática da vida teologal: fé, esperança e caridade. Pelo Baptismo entramos em estado de oração, fizemos profissão de orantes. A vida da fé vive-se de joelhos.

“Somos servos inúteis” – realça o Evangelho. Na hora em que O reconhecemos é que o Senhor há-de vir encher a barca. Na obra de Deus ficamos sempre aquém da grandeza do projecto. À vista do pouco que fazemos, tem o Senhor de vir completar o resto, que é tudo. Só nos fica o esforço humilde de recomeçar cada dia como se fosse o primeiro, retomando a caminhada para o divino repouso, servos de tudo e de todos. É Deus que em nós começa e leva a cabo a sua obra. Depois de tudo o que Deus faz em nós, somos servos inúteis. Deixa fazer!

Assim nos ajude a intercessão da bem-aventuda Virgem Maria, junto a seu Filho Jesus, para que Ele aumente também a nossa fé, para confiarmos inteiramente a nossa vida à divina Providência.

Diácono António Figueiredo

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