O GRÃO DE TRIGO

Reflexão à Liturgia da Palavra da Solenidade de S. Vicente, Diácono e Mártir, Padroeiro Principal do Patriardado de Lisboa.

Neste Domingo, 22 de Janeiro, celebramos a Solenidade de S. Vicente, Diácono e Mártir, Padroeiro Principal do Patriarcado de Lisboa. Por isso, na Diocese de Lisboa a Santa Missa deste Dominmgo é celebrada fazendo memória deste Santo Mártir, por ser o Padroeiro da nossa diocese.

Neste Domingo celebramos também o Domingo da Palavra de Deus. Pelo motu próprio ‹‹Aperuit illis›› – Abriu-lhes o Entendimento – de 30 de Setembro de 2019, o Santo Padre instituiu para toda a Igreja o Domingo da Palavra de Deus, a celebrar todos os anos no terceiro Domingo dio Tempo Comum. Deseja o Santo Padre, que neste Domingo «seja dedicado à celebração, reflexão e divulgação da Palavra de Deus». 

Para este Domingo, em vez das leituras referentes ao III Domingo do Tempo Comumm, Ano A, o Departamento de Liturgia do Patriarcado de Lisboa propõe as seguintes leituras: 1.ª leitura é tirada do Livro de Ben-Sirá 51, 8-17. Para Salmo Responsorial o salmo 58 (59) e para o Evangelho são propostos dois Evangelhos á escolha: S. João 12, 24-26 ou S. Mateus 10, 17-22.

«Vós livrais aqueles que esperam em Vós e os salvais das mãos dos inimigos», ouvimos a Ben Sirá, na primeira leitura, referindo que Deus livra os que n’Ele esperam e os liberta de mãos inimigas. São três os agentes: Os inimigos que perseguem, Deus que liberta e os que esperam em Deus. Com São Vicente, tudo aconteceu assim. Os inimigos que o condenaram e torturaram, com mãos particularmente atrozes. Deus que o recebeu e libertou da “lei da morte”, ou seja, do esquecimento do que fora e tanto assinalara. E Vicente, que venceu e convenceu, na mais activa das esperanças.
Perante as dificuldades e oposições, por graves e gravíssimas que sejam, o verdadeiro crente comporta-se também assim. Sabe que a fé encontrará resistências, bem duras por vezes. Sabe que não faltarão soberanias que, circunscrevendo o horizonte à dimensão temporal que dominam, não suportam nos governados qualquer ligação que as transcenda e possa criticar. Assim acontece com quem detenha o poder pelo poder e igualmente em nome de ideologias várias que, impondo-se pelo geral, não respeitam a irredutível singularidade de cada um. Prepotência e consciência nunca se deram bem.
No passado e ainda no presente, pôde e pode ser assim no campo imediatamente político, quando não se respeitam as declarações universais de direitos, a liberdade religiosa e a indispensável distinção de poderes, entre quem legisla, quem governa e quem julga. Assim aconteceu com o S. Vicente e assim nos irmanamos hoje com muitas outras pessoas de boa vontade, inclusive de outros credos e até além destes, em base humanitária comum. Em pleno oitavário de oração pela unidade dos cristãos, lembremos que a colaboração em tudo o que respeita ao bem do próximo é uma das alíneas principais do progresso que pretendemos.
Mas não esqueçamos o que disse Ben Sirá: Deus livra os que n’Ele esperam. A consequência é dupla, como sentimento e como acção. Como sentimento, porque esperar em Deus é não desistir nunca d’Aquele em quem acreditamos, mesmo que tudo parecesse contradizê-l’O e ausentá-l’O. Como acção, pois a esperança é performativa e realiza já aquilo que a transporta, pela acção possível e sem omissão alguma.

Dizia Jesus no Evangelho e testemunhava-o São Vicente no martírio: «Em verdade, em verdade vos digo: Se o grão de trigo cair na terra e não morrer, fica só ele; mas, se morrer, dá muito fruto.»Falaria Jesus imediatamente de si, que seria morto e sepultado, fazendo da sua morte a doação total da vida e da sepultura a comunhão plena com a nossa condição comum. Em tudo isso não ficou só ele, porque nos acompanhou absolutamente a nós e nos fez reviver a todos. Assim abriu caminho aos seus discípulos, verdadeiros discípulos, como o foi São Vicente. O nosso padroeiro foi diácono, sacramentalmente servo dos pobres de então. Servo sobretudo no testemunho que deu, de ser fiel até ao fim, na fé que demonstrava, na esperança que o levava e na caridade para com os próprios carrascos, que não conseguiram que os odiasse. Na celebração coerente deste dia, teremos de seguir a Cristo assim também, como o fez Vicente. Dispostos a cair na terra comum da necessidade de todos, sem resistir ao dom de nós próprios, nem nos fecharmos em isolamentos sem saída. Pelo contrário, preenchamos a solidão dos outros com a nossa atenção e companhia; colmatemos tanto vazio e lacuna sociocultural e mediática com a presença solidária e criativa que oferece humanidade; estejamos sempre onde devemos estar, disponíveis e totais, pascalmente oferecidos. São muitas as necessidades e urgências, outras tantas oportunidades de entrega. Foi uma lembrança criativa, uma presença fecunda. A barca em que chegara com os corvos guardiães lembrou-o emblematicamente depois. Boa lembrança e permanente estímulo.Especialmente agora, em que a cidade se está a preparar para a Jornada Mundial da Juventude que irá decorrer no próximo mês de Agosto, com visitantes de toda a parte do mundo. E sem esquecer os que cá estavam e devem continuar a estar, respeitados e dignificados na tradição que transportam. Quando se há de refazer em ecologia integral, conjugando o natural e o edificado, a bem da integralidade psicofísica e espiritual de cada ser humano, pessoal, familiar e socialmente integrado.

Diácono António Figueiredo 

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