O DEVER DE SENTAR-SE!

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Meditando as leituras da Liturgia da Palavra do XXIII Domingo do Tempo Comum, Ano C

Para caminharmos da terra ao Céu, no meio de tantos enganos, temos necessidade de alguém que nos oriente, para não nos perdermos. Jesus Cristo veio à terra para nos restituir a vida da graça que o demónio nos tinha roubado e ensinar-nos o caminho da Pátria Celeste. Na Liturgia da Palavra deste 23.º Domingo do Tempo Comum, ano C, o Senhor Jesus oferece-se para nosso guia no caminho da eternidade feliz.
A primeira leitura da Liturgia da Palavra deste Domingo é do Livro da Sabedoria 9,13-19, cujo autor nos diz, sem qualquer atenuante,, que só em Deus encontramos a verdadeira felicidade. Esta certeza deve orientar-nos e fortalecer-nos, quando o nosso inimigo comum tentar semear a confusão dentro de nós.
“Qual o homem que conhece os desígnios de Deus?” – diz-nos a primeira leitura deste Domingo. Anda comigo um pensamento secreto, fio de graça, tecendo a minha história. Todo o nosso esforço consiste em “descobrir o que há nos céus” e ordenar a nossa vida segundo a vontade de Deus. “Quem pode imaginar o que o Senhor quer?”. Tarefa difícil, esforço constante.
A Liturgia deste Domingo propõe para Salmo Responsorial o salmo 89 (90) 3-6.12-14.17. É um hino de louvor à Sabedoria do nosso Deus. Será uma bela oração para todos os nossos dias.
A segunda leitura vem da Epístola de S. Paulo a Filémon 9b-10.12-17, onde Paulo solicita a Filémon para que perdoe e acolha o antigo escravo Onésimo. É uma carta que nos inspira a maneira de nos comportarmos quando nos julgamos ofendidos por alguém.
Nem sempre é fácil descobrir a vontade do Senhor a nosso respeito em situações concrectas da vida. O Evangelho deste Domingo, é de S. Lucas 14, 25-33, vem facilitar a nossa compreensão nos caminhos deste mundo.
Quem quiser construir tem de sentar-se primeiro e calcular. “Qual de vós se não senta primeiro?”  – refere Jesus no Evangelho. Quanto maior for o edifício, mais fundos têm de ser os alicerces. O ideal cristão é a torre que se levanta da humildade do meu ser de criatura. Deus é o construtor e nós somos a construção. “Sem Mim, nada podeis fazer”. O material a empregar é o desejo de ser santos, dando forma e consistência às nossas imperfeições e fracassos. Nada se rejeita; tudo se transforma. Tudo quanto existe e me acontece esconde o seu lado bom, por onde assenta na construção. Tudo é graça.
É Jesus Cristo que cresce em nós e se edifica até à estatura perfeita. O termo é longe e difícil. Tenho de sentar-me e discernir critérios, confirmar decisões, segundo as exigências de Jesus Cristo e da fé. O Evangelho mostra-nos o caminho para encontrarmos a vontade de Deus mas quem em nós a busca e discerne é o Espírito Santo “a sabedoria do alto”.
O discernimento evangélico tem método e exigências. Tudo se reduz a ter os mesmos sentimentos de Jesus Cristo, pensar como Ele pensava, querer o que Ele quer. Se não entrar em discernimento, desarmado das minhas razões, descalço dos meus critérios, não poderei escutar a voz do Senhor na sarça ardente. Faz-se na escuta do Espírito, ponderando e reflectindo. Vive-se em docilidade à graça, decidindo e actuando. Não se trata de medir e calcular, mas do esforço humilde de quem quer dar tudo. O discernimento espiritual faz do cristão o homem livre, que se move na luz de Deus e na fidelidade aos seus projectos.
No Evangelho Jesus diz “Para me seguir”. O cristão entra na escola de Jesus Cristo para O saber imitar. Ser discípulo exige uma opção radical, preferência de amor, que dói e crucifica. Para segui-l’O, tenho de renunciar a tudo o que impede o amor absoluto, porque o amor perfeito não admite partilhas nem concorrentes. A dificuldade dos meios que propôs revela a grandeza do projecto a realizar. É preciso cortar, arrancar, podar, sacrificando tudo ao amor total. Há servidões e apegos que são traições ao amor, negações de Jesus Cristo. Abnegações e renúncias são o contínuo acabamento da obra de Jesus Cristo em nós.
“Quem não carrega a própria cruz, não pode ser meu discípulo” – avisa Jesus no Evangelho. A cruz é a lógica e coerência do nosso ser e agir de cristãos, a sabedoria que vence o mundo. Toda a prova e discernimento está na cruz de Jesus Cristo. Mas só à luz do Espírito Santo a cruz se entende e se abraça. Em cada renúncia que vivo, há dentro de mim uma pessoa a nascer. Quando for erguido na cruz, então começo a ser discípulo de Jesus Cristo.
Maria acolhe generosamente a cruz de cada dia: as dúvidas de José, antes de o Anjo lhe ter revelado o mistério do que se passava n’Ela, o desconforto de Belém, a fuga para o Egipto, a viuvez precoce e a morte de Jesus, porque colocou sempre e em tudo a vontade de Deus em primeiro lugar. Peçamos a sua ajuda materna, para a imitarmos a seguir os caminho do Céu.

Diácono António Figueiredo