O AMOR QUE ESCANDALIZA

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Reflexão à Liturgia da Palavra do 4º Domingo da Quaresma, Ano C

 

A parábola do filho pródigo é o retrato vivo do amor misericordioso. A salvação que Deus nos dá começa em misericórdia. Somos todos ovelhas perdidas, filhos transviados, sempre em regresso à Casa do Pai. Misericórdia é o nosso grito, o pão da nossa fome. De cativeiros faz libertação.

Em pleno Ano Jubilar, no caminho para a Páscoa, cheios de Esperança, cantamos e celebramos com alegria, a Bondade do nosso Redentor. Temos certeza que há festa na Casa do Pai. Ele nos espera ao passo lento do filho que regressa, corre veloz a misericórdia do Pai que o abraça. Vai à frente o perdão, quando vem longe o arrependimento. Há festa em Casa do Pai,.

Depois da tomada de Jericó, os hebreus, chefiados por Josué, entram finalmente na Terra da Promissão e começaram uma vida normal, alimentando-se com  fruto da terra.  É o princípio de uma vida nova na terra da  felicidade, da paz,da liberdade. A primeira leitura é do livro de Josué 5, 9a.10-12. Esta leitura fala-nos do início de uma nova vida do povo eleito, após a longa e dura travessia do deserto. O facto de ter sido escolhido para este tempo, em que o deserto da Quaresma caminha para o seu fim, pode ter um significado simbólico ligado ao Evangelho do filho pródigo: o regresso à Casa paterna , a conversão, o começo de uma vida nova.

O cântico/salmo 33, vem recordar-nos que quem experimenta a misericórdia divina, pode reconhecer e saborear constantemente, como o Senhor é bom. “Saboreai e vede como o Senhor é bom”é o refrão do Salmo Responsorial para o qual a Liturgia propõe o salmo 33(34),2-3.4-5.6-7.

A segunda leitura, da Segunda  Epistola de S. Paulo aos Coríntios 5,17-21, convida-nos a acolher a oferta de amor que Deus nos faz através de Jesus. Só reconciliados com Deus e com os irmãos poderemos ser criaturas novas, em quem se manifesta o homem novo.

Jesus fala-nos uma vez mais do Pai e diz-nos que Ele é um Pai que ama de forma gratuita, com um amor fiel e eterno, apesar das escolhas erradas e da responsabilidade do filho rebelde. É esse amor misericordioso que lá está, sempre à espera, sem condições, para acolher e abraçar o filho que decide voltar.

“Encheu-se de compaixão e beijou-o” – (v.20) do Evangelho segundo S. Lucas 15,1-3.11-32). A conversão começa no amor misericordioso. Foi o amor que nos tocou o coração e fez voltar para Ele. Convertemo-nos ao amor. O amor do Pai aparece como protagonista de toda a nossa história de abandonos e cativeiros. O livro branco da vida, a história das relações de Deus com o homem, resume-se na história dos Seus perdões. Maior que todos os nossos pecados é o amor que nos tem. Onde abundou o pecado, superabundou a misericórdia. A maldade humana é limitada, mas a misericórdia de Deus é infinita. Sai o Pai ao encontro do filho ausente e está com ele na busca de caminhos de regresso. Fomes e desilusões são presença misteriosa de Deus, iniciando a marcha. Para o coração do Pai até cativeiros são graça e o mal se converte em bem.

Deus perdoa sempre porque ama sempre. Quando deixasse de perdoar deixaria de amar; e quando deixasse de amar, deixaria de ser Deus. Não são os nossos méritos que O movem a amar. Ama com amor gratuito, ama porque é Amor. Por isso, antes do filho antes do filho Lhe pedi r isso o Pai se antecipa a perdoar, antes do filho lhe pedir perdão. Na ordem da graça, Deus chega sempre primeiro. Deus não precisa dos meus méritos para me amar sem lei e sem medida. “Tínhamos de fazer uma festa”. Perdoar traduz a divina impaciência, a divina obrigação que Deus se deve a si mesmo. É o amor que O obriga. Para o coração do Pai perdoar é uma festa.

“O filho mais velho andava no campo”. Estava longe da festa dos outros. A misericórdia de Deus é mistério, que a uns converte e a outros escandaliza. Jesus perdoa a publicanos e pecadores, mas os escribas e fariseus murmuram  Em resposta, Jesus contou-lhes a parábola dos dois filhos: o mais novo, publicano e o mais velho, fariseu. A lição era para o mais velho. Qual deles o mais pecador?

A parábola da nossa vida tem o pecado dos dois filhos. Tenho medo das minhas fugas apressadas e ainda mais das minhas virtudes presumidas. Se há equívocos no amor que nos transviam, há durezas de coração, que nos impedem de voltar. O filho mais novo regressa (o publicano)de suas desilusões mas o filho fariseu (o mais velho) entrincheirou-se nas suas observâncias e não se rendeu ao amor, recusando-se a entrar.  Ambos pecaram e ambos foram acolhidos pelo Pai. Para ambos “Veio o Pai cá fora”, no mesmo gesto do amor misericordioso. O mais novo converteu-se; o outro, não.

“Nunca me deste um cabrito”  lamente o filho mais velho. Também tu te escandalizas? Também tu te recusas a entrar na alegria dos teus irmãos, só movido de interesses e cabritos? Se for assim, o teu amor não ultrapassa o de escribas e fariseus: O homem mede-se pela capacidade de perdoar. Só os medíocres não perdoam. Não basta ser observante; é preciso amar. Não sirvas por interesse ou obrigação, mas por amor. A nova ordem que Jesus Cristo inaugurou quer amor e não legalismo.

Em questão de amor, não te fixes tanto no que fazes, mas muito mais no que tinhas de fazer. As nossas omissões são o grande pecado contra o amor. “Pai, pequei”.

Será que sabemos alegrar-nos pelos outros? Que a Bem-aventurada Virgem Santa Maria nos ensine a acolher a misericórdia de Deus, para que se torne a luz na qual olhar para o nosso próximo.