ESCUTA, ISRAEL

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Reflexão à Liturgia da Palavra do XXXI Domingo do Tempo Comum, Ano B

A Liturgia da Palavra deste  trigésimo primeiro Domingo do Tempo Comum, Ano B, move-nos a renovar ou talvez a corrigir a ideia que temos dos Mandamentos da Lei de Deus e a conhecê-los e amá-los como dons preciosos do Senhor. “Temerás o Senhor teu Deus”, diz a primeira leitura, do Livro do Deuteronómio 6, 2-6. Deus ama-nos com toda a nossa vida, na mais funda raíz do nosso ser e agir. Tudo no ser humano encerra uma exigência de amor, uma capacidade de amar. Amar com a alma quer dizer amar com todos os nossos sentimentos e emoções. Amar com todas as forças requer orientar para Deus toda a nossa afectividade e iniciativas. Amar com a mente significa penetrar de amor todas as nossas razões e critérios. Amar a Deus com todo o coração é amá-l’O com todo o nosso ser, dirigir para Ele acções e pensamentos, n’Ele  mover-se e existir.

Que lugar ocupa Deus na minha vida? Converto tantas vezes o essencial em acessório, deixo o absoluto pelo relativo. Em lugar de Deus colocamos ídolos de barro: o dinheiro, o sucesso, as honras e o poder. Assim se inverte o sentido da vida e se enganam as exigências do coração. Falsos valores levam a uma falsa felicidade  que ilude a verdade da pessoa humana. Depois da Aliança do Sinai, Moisés transmite os Dez Mandamentos ao Povo Hebreu, como compromisso desta Aliança que acabam de fazer com Deus. A eles e a todos nós promete, como prémio desta fidelidade à vontade de Deus, a felicidade já nesta vida e na eternidade.

“Eu Vos amo Senhor: Vós Sois a minha força”, é o refrão do Salmo Responsorial, para o qual a Liturgia propõe o salmo 17 (18), 2-3.4.47.50-51ab. Acreditamos firmemente na sinceridade do Amor de Deus para connosco, mesmo quando nos custa cumprir os Seus Mandamentos. Por isso, o Espírito Santo move-nos a exteriorizar os nossos sentimentos, manifestando a nossa confiança no Senhor.

Na segunda leitura continuamos a ler, escutar e meditar na Epístola aos Hebreus, hoje Hebreus 7, 23-28. Jesus Cristo é o Sumo Sacerdote da nova Aliança, realizada no Calvário, que intercede continuamente por nós junto do Pai. Tenhamos toda a confiança na Sua mediação e animemo-nos a recomeçar todos os dias, o caminho do amor de Deus.

A fidelidade aos Mandamentos é a primeira condição para dizermos, com verdade que amamos o nosso Deus sobre todas as coisas. Na passagem evangélica  deste Domingo, do Evangelho segundo S. Marcos 12, 28b-34, um escriba interroga Jesus: “Qual é o primeiro de todos os mandamentos?” Jesus respondeu: “O primeiro é este: Escuta, Israel: O Senhor nosso Deus é o único Senhor. Amarás o Senhor teu Deus com todo  teu coração, com toda a tua alma , com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças.” Jesus prosseguiu: “O segundo é este: Amarás o teu próximo como a ti mesmo”

Jesus Cristo não veio abolir a Lei, mas cumpri-la. Foi esta a novidade e o cumprimento que Jesus Cristo lhe deu: “O segundo é semelhante ao primeiro” (S. Mateus 22,39). O Amor de Deus e do próximo constituem um só amor, que se iluminam e completam um ao outro. O amor é indiviso, mas apresenta duas faces, segundo a luz que o ilumina. Se olho à fonte é amor de Deus: se me miro na corrente é amor do próximo. Mas é um só e o mesmo amor, que em mim nasceu e actua, que me atrai e compromete. O amor do próximo supõe o amor de Deus, como primeiro e absoluto. Antes de sermos irmãos temos de ser filhos. Se somos irmãos é porque Deus é Pai, princípio de amor, fonte de vida. Mas se na ordem da excelência, primeiro é o amor de Deus, contudo na ordem da execução, primeiro é o amor do próximo. “Quem não ama o seu irmão a quem vê, não poderá amar a Deus, que não vê” (1.ª Epístola de S. João 4,20). Mais ainda: amar o próximo é amar-me a mim mesmo, reconhecer-me no outro, como membro do meu corpo, carne da minha carne. Se desprezo alguém e o rejeito, ofendo a minha pessoa e impeço o meu crescimento.

“Amá-l’O com todo o coração, com toda a inteligência e com todas as forças e amar o próximo como a si mesmo, vale mais que todos os holocaustos e sacrifícios”, diz o escriba a Jesus. Jesus Cristo veio estabelecer o primado do Espírito sobre a letra, do amor sobre as observâncias. O Evangelho é claro. Mas ainda há muitos seguidores de Jesus Cristo que estão mais longe do que este escriba. Com medo de amar, enterram o talento na frieza térrea de ritos e observâncias. Jesus Cristo não fez assim. Acolhia publicanos e mulheres pecadoras, sem olhar a conveniências e observâncias, porque o amor tem razões, que a lei não sabe nem entende. Que entendo eu de amor do próximo? Talvez um amor em projecto, resguardado em intenções e desejos. Que significa para mim amar de todo o coração? Tenho medo de dar o que Deus não teve medo de exigir. Senhor, ensina-nos a amar! Que a Bem-aventurada Virgem Santa Maria, em quem a Palavra de Deus se fez carne, nos ensine a acolher no coração as palavras vivas do Evangelho.

Diácono António Figueiredo