A TENTAÇÃO DO PODER

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Reflexão à Liturgia da Palavra do XXIX Domingo do Tempo Comum Ano B

Anda o mundo atrás de ídolos, dobrando o joelho a toda a hora. Uns, escravos do dinheiro, como o jovem rico; outros tentados pelo poder, como Tiago e João.
Celebramos hoje o Dia Mundial das Missões. A Santa Igreja convida-nos a espevitar o nosso ardor missionário, sentindo a urgência de trabalhar para que todos conheçam e amem a Jesus Cristo. Avivemos a nossa fé e examinemo-nos de tantas omissões no campo do apostolado que o Senhor confiou a todos.
A primeira leitura é da Profecia de Isaías 53, 10-11. Nesta passagem o profeta fala do Messias que havia de vir e da salvação que alcançará para todos os homens, através da oferta de Si mesmo em sacrifício.
“Desça sobre nós a Vossa misericórdia, porque em Vós esperamos Senhor”, é o refrão do Salmo Responsorial, para o qual a Liturgia propõe o salmo 32 (33) 4-5.18-19.20-21. Este salmo canta a salvação de Deus para os Seus fiéis.
Na segunda leitura temos a Epístola aos Hebreus 4, 14-16. Nesta carta o autor apresenta-nos Jesus como nosso Sumo Sacerdote, muito perto de Deus e muito perto de nós.
No Evangelho, S. Marcos 10, 35-45, Jesus fala da verdadeira grandeza que está em servir os outros. Tiago e João, filhos de Zebedeu, pediram a Jesus: “Concede-nos que na Tua glória nos sentemos, um à Tua direita e outro à Tua esquerda”. A tentação do poder entra em toda a parte, mesmo no lugar santo. Anda o poder desfigurado pelo falso rosto de honras e grandezas, corrompido por injustiças e ambições pessoais. Mandar é servir. Os governantes são servos do bem comum dos cidadãos que os elegem. Servem o povo e não o partido. Antes de serem servos de qualquer ideologia, são servos do povo. Políticos e governantes têm muito que aprender.
Face ao pedido de Tiago e João para terem primazia no Reino dos Céus, Jesus esclarece que os poderosos deste mundo lutam pelos primeiros lugares e advertiu: “Não deve ser assim entre vós”. “Quem quiser ser o primeiro, tem de ser o servo de todos”. Bem claro. A autoridade da Igreja não é poder que se conquista, mas serviço que se dá. Não é ambição de grandezas, mas missão a cumprir, enviados em pobreza, sem bolsa nem alforge. Não há fumos de incenso, nem tronos, nem pedestais. Neste serviço dos irmãos não são as pessoas que buscam os cargos, mas os cargos que buscam as pessoas. Quem mais amar e servir, esse será o maior. O primeiro lugar faz-se daquele “mais” que hei-de pôr em tudo o que amo e que faço. Onde eu estiver, servindo e amando, aí está o primeiro lugar. Vai o lugar ter comigo e não sou eu que vou ter com ele. Na ânsia de amar, na ambição de servir terei acesso a honras e grandezas.
“Podeis beber o cálice que Eu vou beber e receber o Baptismo com que vou ser baptizado?”. perguntou Jesus a Tiago e a João. O poder de mandar oculta-se por detrás de atractivos e aparências. Mas a realidade é bem diferente. O perfil evangélico do superior revela-se ao mundo pela capacidade de pôr a vida pelos irmãos em amor e serviço. O seu salário mais certo será dor e humilhação. Quem aceita governar aceita sofrer, bebendo o mesmo cálice que o Senhor bebeu. O poder anda ligado a cálices de amargura e “dar a vida” pelos outros. Quando assim não for, não é servir, mas ser servido, não é poder, mas usurpação. Por isso a definição evangélica do poder nos vem dada no contexto do anúncio da Paixão. Quem aceita governar aceita entrar em agonia, onde domina e permanece a aridez insistente de humilhações e fracassos, de críticas e solidões.
“Não sabeis o que pedis”, diz Jesus aos dois Apóstolos. Na nossa oração e critérios de valor há muito dos filhos de Zebedeu. Queremos o poder de Deus ao nosso serviço, em troca de fidelidades, pretendemos benefícios e promoções. Não sabemos que a felicidade nasce da renúncia e que o preço da alegria é varrer a casa primeiro. Queríamos amar sem amor e ressuscitar sem morrer.
O êxito da vida, a resposta aos nossos anseios está na disposição radical de beber o cálice que Jesus bebeu.
A Bem-aventurada Virgem Santa Maria, a primeira discípula missionária, faça crescer em todos nós, os baptizados, o desejo de ser sal e luz nas nossas terras.

Diácono António Figueiredo