
Reflexão à Liturgia da Palavra do XXVIII Domingo do Tempo Comum Ano B
Todos queremos a vida eterna e corremos em sua busca, como aquele homem que nos relata o Evangelho. Também nós temos muitos bens, mas sentimo-nos vazios, enquanto não asseguramos o único necessário.
Continuamos a escutar o Evangelho de S. Marcos, no qual Jesus instrui os seus discípulos enquanto caminham para Jerusalém. Se no Domingo passado o tema da liturgia era a fidelidade conjugal, hoje é a pobreza voluntária exigida, para de forma livre seguir Jesus Cristo. O apelo à pobreza evangélica constitui um desafio para todos os tempos da Igreja.
Salomão, a quem é atribuído o livro da Sabedoria, oferece-nos o elogio à verdadeira e autêntica sabedoria, bem como a forma de a alcançar. A primeira leitura é do livro da Sabedoria 7, 7-11. Esta leitura é tirada da segunda parte desta obra, que trata da verdadeira sabedoria , aquela que leva a Deus e do modo de a alcançar.
“Ensinai-nos a contar os nossos dias, para chegarmos à sabedoria do coração”, rezamos ou cantamos no primeiro versículo da primeira quadra do salmo 89 (90) 12-13.14-15.16-17, que a Liturgia propõe para Salmo Responsorial. Este salmo é a oração de Moisés, o homem de Deus, como súplica Àquele que é o Autor de toda a sabedoria.
O autor da Epístola aos Hebreus oferece-nos um elogio à Palavra que nos foi revelada em Jesus Cristo, o Verbo Encarnado. Ele é a Palavra viva e eficaz que alimenta a vida da Igreja. A segunda leitura é respigada da Epístola aos Hebreus 4, 12-13.
No Evangelho, S. Marcos 10, 17-30, o Evangelista apresenta «um homem» que se dirige a Jesus, interrogando-O sobre o que deve fazer para alcançar a vida eterna. Respondendo ao homem, Jesus ensina como lidar com as riquezas e os caminhos a percorrer para alcançar o Reino dos Céus, que passa necessàriamente pelo cumprimento dos mandamentos. O homem argumenta que desde a juventude sempre cumpriu os mandamentos. O Evangelista narra que Jesus olhou com “simpatia” para o seu interlocutor e disse-lhe: “ Falta-te uma coisa”. Ninguém se julgue perfeito. Mesmo que pensemos que já cumprimos tudo, falta-nos sempre alguma coisa, somos servos inúteis. A perfeição exige sempre mais. Está para além do momento que passa, da meta que se alcança. Não se define em fazer isto ou aquilo , chegar aqui ou além. Seria ignorá-la e diminui-la. É caminhar sem nos darmos conta, é tocar sem sentir, dar sem saber que se dá, receber sem saber que se recebe.
“Vai vender o que tens”, continua Jesus. O seguidor de Jesus Cristo tem de optar pela pobreza,, proposta como ideal a todos os discípulos e não apenas para escolhidos. Todo o cristão é chamado à felicidade de ser pobre. Assim o compreenderam logo os primeiros cristãos, que vendiam os seus haveres para ter tudo em comum. A pobreza evangélica consiste em partilhar. O ideal não é a carência, mas que não haja necessitados (Actos dos Apóstolos 4, 34-35). Não é o vazio de coisas, mas o amor que se reparte.
Ser cristão é seguir Jesus Cristo em hábitos de pobreza, professando renúncias e desprendimentos. Os leigos cristãos que vivem situações de pobreza, que a regra da vida lhes traz expressa nos acontecimentos. Possuem como se não possuíssem, libertos de ganâncias e apegos materiais. A pobreza é a divina invenção de ter tudo, não tendo nada.
O Reino de Deus é o Reino dos pobres. Foi a sorte que lhes coube, assegurada pela palavra de Jesus Cristo. Foram e continuam a ser injustamente esquecidos no sorteio dos bens terrenos, mas Deus veio em sua defesa e quis fazer-se Ele mesmo a sua herança. Os ricos, escravos das coisas, que põem na riqueza a sua felicidade, não têm lugar no reino dos pobres. Não é por serem ricos que serão condenados, mas por fazerem da riqueza o ídolo a quem adoram. Viver em pobreza é a divina sabedoria. Quem for sábio dará por ela todo o ouro do mundo.
“Dá aos pobres”, diz Jesus no Evangelho. Não basta desprender-nos; é preciso dar. Somos pobres para dar, pobres por amor,. Jesus Cristo fez-se pobre para nos enriquecer com o seu despojo. Se vivemos desprendidos e despojados é para partilhar com os outros aquilo que possuímos, dons da natureza e da graça. Dar aos pobres é abrir-se aos outros e tornar-se atento e disponível aos seus apelos. Uma atenção, um sorriso, um serviço prestado são o pão que sacia e alegra a festa dos pobres.
Vamos partilhar o que temos e ainda mais, o que somos. Esta é a perfeita pobreza. O prémio é a vida eterna.
Seguindo o exemplo da Bem-aventura Virgem Santa Maria, peçamos a sua intercessão para que nos ajude a desprender-nos dos bens temporais e procuremos a verdadeira riqueza seguindo Jesus Cristo na pobreza e no desprendimento dos bens temporais.


