E VÓS, QUE DIZEIS?

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Reflexão à Liturgia da Palavra do XXIV Domingo do Tempo Comum, Ano B

Começa a cruz a levantar-se no horizonte da vida, como pedra de escândalo e é preciso enfrentá-la. Para cruzes e agonias ninguém está preparado. Por mais que se anuncie será sempre surpresa.
A nossa vida é muitas vezes totalmente o contrário daquilo que sonhávamos, porque não somos capazes de vencer a tentação de encontrar o céu nesta vida. E assim tudo o que não é conforme aos nossos sonhos faz-nos sofrer.
Na Liturgia da Palavra deste vigésimo quarto Domingo do Tempo Comum, Ano B, o Senhor ensina-nos que encontraremos a cruz enquanto estivermos nesta vida da terra, mas promete-nos que estará sempre ao nosso lado para nos ajudar.
Na primeira leitura, Isaías 50, 5-9a, o profeta Isaías , mais de seiscentos antes que isto acontecesse, fala-nos da Paixão de Jesus com profundo realismo. Ela não foi uma fatalidade, nem algo que Jesus não quisesse e não pôde fugir, mas a arma que venceu o demónio e nos libertou da sua escravidão.
Para Salmo Responsorial, a Liturgia propõe o salmo 114 (115), 1-2.3-4.5-6.8-9. O salmista dirige-se ao Senhor cheio de confiança, para Lhe dizer que o sofrimento não o impedirá de seguir os Seus caminhos. Manifestemos ao Senhor estes mesmos sentimentos, não permitindo que as cruzes de cada dia nos façam desconfiar do amor de Deus para connosco.
A segunda leitura é da Epístola de S. Tiago 2, 14-18. Nesta Carta S. Tiago menor dirige-se aos fiéis do mundo inteiro para nos ensinar que a nossa fé em Deus tem de se manifestar com frutos de boas obras. A cada um de nós S. Tiago lança um solene desafio: “Mostra-me a tua fé sem obras, que eu, pelas obras, te mostrarei a minha fé”.
A cruz de cada dia não é, nem deve ser para nós uma humilhação, mas um motivo de glória, porque por ela participamos na missão redentora de Jesus. Por isso, cantamos com verdade as palavras de S. Paulo: “Toda a minha glória está na cruz do Senhor, por quem o mundo está crucificado para mim e eu para o mundo”. “Quem dizem os homens que Eu sou?”, pergunta Jesus na passagem evangélica deste Domingo, S. Marcos 8, 27-35. Todos falam d’Ele. Uns louvam, outros condenam. Os fariseus acusam-n’O de blasfemo e amigo dos pecadores. O povo simples vê n’Ele outro João Baptista, outro Elias ou algum outro profeta. Jesus Cristo será sempre sinal de contradição. É a marca que O distingue, a credencial evangélica de quem O quer seguir.
“E vós, quem dizeis que Eu sou?”, insiste Jesus. O importante não é o que os outros pensam, mas o que eu penso, o que tu pensas. Pedro responde por ele; e tenho de responder por mim. Perante Jesus Cristo urge uma resposta pessoal, que nos marca e compromete. Quem O aceitar tem de saber quem Ele é; quem O seguir há-de saber para onde. Jesus Cristo não consente ao seu lado atitudes inconstantes e duvidosas de quem serve a dois senhores. É a resposta medíocre dos que olham para trás, tornando-se inaptos para o Reino de Deus.
“Depois começou a ensinar-lhes …”, prossegue a descrição evangélica. O Messias de Pedro tinha ainda muito de terreno e triunfal. A resposta era imperfeita. E a minha? Jesus Cristo corrige a resposta, desvendando o mistério da Sua Pessoa e missão. Não há Jesus Cristo sem cruz. E nós pretendemos eliminá-la do nosso caminho, ocultando-lhe a face, fugindo à aspereza de despojos e ignomínias.
O Cristo que seguimos é um Cristo crucificado. Quando eu tomar a cruz todos os dias , renasce em mim a vida nova e começo a ser discípulo de Jesus Cristo. A cruz é lição nunca aprendida, a recusa sistemática do nosso olhar gentio. A resposta perfeita está em Jesus Cristo morto e ressuscitado.
“Porque não compreende as coisas de Deus, mas só as dos homens”, Jesus repreende Pedro. Face à cruz insinua-se a tentação e reagimos como Pedro. Os nossos pensamentos vêm ditados por interesses humanos e egoístas. As nossas atitudes dúbias e conciliadoras têm ares de suborno e tentação. “Retira-te, Satanás!” Foi também assim na tentação do deserto. Os pensamentos de Deus são diferentes: “Porventura não era necessário que Cristo sofresse para entrar na Sua glória?” (Lc 24,26). Aceitemos sem protesto, verdades que nos transcendem, mas recusamos escandalizados os mistérios que doem..
“Quem perder a vida por causa de Mim e do Evangelho, salvá-la-á”, conclui Jesus. Os que são de Jesus Cristo seguem atrás d’Ele para onde for. O distintivo é a cruz. Nela vamos dar a maior prova de amor, perfeita expressão de perder-se por alguém. Renunciar-se é perder a vida para a ganhar, morrer como o grão de trigo para dar fruto,. Quando perdemos a vida por casa de Jesus Cristo e do Evangelho, entrará em nós a salvação e chegaremos à plenitude.
A Bem-aventurada Virgem Santa Maria abraçou generosamente as pequenas e as grandes dificuldades da vida e não se desviou um milímetro do caminho que Deus lhe traçou. Aprendamos com ela.

Diácono António Figueiredo