DOR QUE SE TRANSFIGURA

By

Reflexão a Liturgia da Palavra do II Domingo da Quaresma Ano B

O mistério de Cristo transfigurado lança uma luz nova no caminho da penitência para a Páscoa. A antevisão de Cristo glorioso é um alerta de esperança, certeza de meta à vista. O caminho é a cruz, mas o termo é a transfiguração definitiva na ressurreição.
A transfiguração revela o mistério de Cristo, oculto no seu despojo voluntário e ilumina a sua missão sofredora de “filho do homem”, na revelação da glória do Filho de Deus. Começam já as realidades a chamar-se pelo nome.. Mais um pouco e vereis. Pelos caminhos da fé, a lógica se esconde no desconcertante e imprevisto, no absurdo de morrer para ressuscitar. A Quaresma é um tempo favorável à nossa conversão é um tempo para nos desligarmos do homem velho; é um tempo de renovação sobrenatural mediante os Sacramentos.
A transfiguração do Senhor no alto do Monte Tabor, que o Evangelho de hoje nos relata, lembra-nos que através do esforço quaresmal do seguimento de Jesus Cristo na sua Paixão, chegaremos também nós à alegria da Sua Ressurreição gloriosa.
Deus pôs à prova Abraão, pedindo-lhe o sacrifício de seu filho único tanto tempo esperado. O santo patriarca é para nós modelo de obediência à vontade do Pai. O sacrifício de Isaac é figura do sacrifício de Jesus Cristo, que iria realizar-se no mesmo lugar. “Deus quis pôr a prova Abraão”. Começa assim a primeira leitura, tirada do livro do Génesis 22, 1-2.9a.10-13.15-18.
O Salmo Responsorial que vamos meditar, lembra-nos que a nossa confiança em Deus e na Sua misericórdia deve ser absoluta e total. “Caminherei na terra dos vivos na presença do Senhor”, é o refrão do salmo 115 (116), 10-15.16-17.18-19, que serve de Salmo Responsorial.
S. Paulo lembra-nos o infinito amor que Deus nos demonstrou, entregando-nos o Seu amado Filho, para ser sacrificado por nós. “Se Deus está por nós quem estará contra nós?”. É assim que começa a segunda leitura, tirada da Epístola de S. Paulo aos Romanos 8, 31b-34.
Jesus transfigura-Se no cimo do monte Tabor, enchendo de alegria os Apóstolos e preparando-os para o escândalo da Paixão. Ele é o Filho muito amado do Pai.”Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e subiu a sós com eles para um alto monte e transfigurou-Se diante deles”, refere a passagem evangélica deste Domingo, tirada do Evangelho segundo S. Marcos 9, 2-10. A revelação de Deus aos homens e a História da Salvação, faz-se de monte em monte O Sinai e o Horeb, Tabor e Calvário, elevam o homem ao encontro de Deus, tocando o seu mistério. Tudo aponta para Jesus Cristo Senhor, o cimo da História, a meta sonhada da tenda definitiva. Das alturas da vida e eminências do ser humano, tudo o que o olhar avista só toma clareza e perspetiva em Jesus Cristo ressuscitado, para onde converge e tem sentido.
Mas para chegar ao monte, tenho de despojar-me da carga inútil, do peso ilusório de falsos apoios e seguranças Depois de tudo, subirei a ver a Deus e serei transfigurado no verdadeiro monte que é Jesus Cristo. Ser alcançado por Ele, é chegar ao alto de mim mesmo e da vida. Então transparecerá a minha realidade oculta. Também eu era monte e não sabia.
“Apareceram-lhe Moisés e Elias”. Falavam com Jesus. A Lei e os Profetas rejubilam por esta hora, que anteviram e ante gozaram. As promessas e a aliança nova anunciadas realizaram-se em Jesus Cristo. No mistério da Transfiguração encontram-se os dois Testamentos: a profecia e o profetizado, os mensageiros e a mensagem. Calam-se as vozes, dissipam-se as figuras para dar lugar ao “Filho muito amado”, único Profeta e Profecia do Pai.
Moisés e Elias falavam com Jesus Cristo àcerca da sua morte. No triunfo do monte celebrava-se a Paixão. Glória e cruz caminham juntas, identificadas no mesmo ser e objectivo final. Não há glória sem cruz, nem dor sem transfiguração. Não são deste mundo as tendas definitivas do gozo e da alegria. Só haverá triunfo verdadeiro, quando Ele falar de Paixão.
“Este é o Meu Filho muito amado. Escutai-O”. A voz do Pai exalta o Filho, respondendo ao seu despojo e humilhação. Ele O envia e apresenta. Crucifica-O e exalta-O. Baptizados em Jesus Cristo, também fomos transfigurados à Sua Imagem. Somos por graça os filhos muito amados, as complacências do Pai, como Jesus. Para isso temos de estar à escuta, seguindo e imitando a Jesus Cristo, o irmão muito amado.
O cristão anda no mundo sem ser do mundo, à espera da revelação da glória que nos está preparada. O ardor da caridade e o brilho da fé são o lume novo que tudo ilumina e transfigura. A Bem-aventurada Virgem Santa Maria embora fosse a mais próxima de Deus entre as criaturas humanas, caminhou dia após dia como numa peregrinação da fé, conservando e meditando constantemente no seu coração a Palavra que Deus lhe dirigia, tanto através das Sagradas Escrituras como diante dos acontecimentos da vida de seu Filho, nos quais reconhecia e acolhia a voz misteriosa do Senhor. Eis então o dom e o compromisso para cada um de nós no período quaresmal: ouvir Jesus Cristo como Maria. Ouvi-l’O na Sua Palavra, conservada na Sagrada Escritura. Ouvi-l’O nos próprios acontecimentos da nossa vida, procurando ler neles as mensagens da Providência. Enfim, ouvi-l’O nos irmãos , de maneira muito especial nos pequeninos e nos pobres, nos quais o próprio Jesus exige o nosso amor concreto. Ouvir Jesus Cristo e obedecer à Sua voz: este é o principal objectivo o único que conduz à plenitude da alegria e do amor.
Oremos à Bem-aventurada Virgem Santa Maria, a fim de que nos ajude a receber com admiração a luz de Jesus Cristo, a preservá-la e a partilhá-la.

Diácono António