OH, SE DESCÊSSEIS!

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Reflexão à Liturgia da Palavra do I Domingo do Advento Ano B

Começa um novo ano litúrgico, ano do Senhor, ano da salvação. Mais uma vez vai Jesus Cristo ressuscitado andar os nossos caminhos, viver a nossa vida. Mais uma vez a Igreja nos chama a participar na sua obra redentora, assumindo cada um a sua função sacerdotal. Os ritos sagrados são o viver de cada dia. Vamos fazer a nossa parte, actualizando o mistério de Jesus Cristo, reproduzindo a Sua vida aos ritmo dos Seus passos. Assim se completa em nós o Cristo total, como membros do seu corpo e o Verbo do Pai recomeça outra vez.
Celebrar Advento é entrar na corrente da graça, que o leva o mundo a Jesus Cristo e por Ele sobe ao Pai. A salvação de Deus acontece no tempo, insere-se na vida até completar a sua obra. No tempo e na história esconde-se o Cristo ressuscitado, dando sentido e finalidade às realidades terrenas. Os sucessos da vida e evoluções do ser humano são liturgia de Deus.
O Advento é o tempo de preparação para o Natal do Senhor. Advento quer dizer chegada ou vinda. Damos graças pela primeira vinda de Jesus, celebrando o seu nascimento em Belém e aguardamos em jubilosa esperança a Sua última vinda, no fim dos tempos. Entre a primeira vinda e a última, «Jesus vem até nós e cada homem e em cada tempo para que o recebamos na caridade».A Igreja celebra o mistério do seu Senhor, até que Ele venha e «Deus seja tudo em todos» (Prefácio do Advento). Desde a era Apostólica, a liturgia é atraída para o seu termo pelo gemido do Espírito na Igreja: «Marana thá! Ámen. Vem Senhor Jesus.» (1.ªEpístola de S. Paulo aos Coríntios 16,22; Apocalipse 22, 17.20).
Na primeira leitura, tirada do Livro de Isaías 63, 16b-17.19b;64,2b-7, encontramos uma oração, que exprime os sentimentos de gratidão dos israelitas que regressavam à sua pátria, depois do exílio: «Nunca os ouvidos escutaram, nem os olhos viram que um Deus, além de Vós fizesse tanto em favor dos que n’Ele esperam». “Oh, se rasgásseis os céus e descêsseis” (v. 19b). O ser humano sente a necessidade de Deus e chama por Ele do fundo dos seus caminhos.A civilização da abundância não enche os nosos anseios nem destinos. Num mundo sem alma crescem ódios e desesperos que esperam redenção. As nossas vestes e pobrezas, “veste imunda”, gritam pelo Senhor para que desça e nos salve. À nossa incapacidade de subir, responde o Senhor descendo. E mais do que descer, esvaziou-se de poderes e esplendores para não envergonhar a nossa pobreza e fragilidade natural. A História da Salvação são descidas de Deus, julgamentos de amor e de perdão. “Vem, Senhor Jesus!”
“Marana thá, vem Senhor Jesus!”. Existe um cântico de Advento com este refrão: “Esperamos no Senhor até Ele aparecer. Vem, Senhor Jesus, ó vem depressa. Com o salmista hoje cantamos algo semelhante: “Deus dos exércitos vinde de novo, olhai dos céus e vede, visitai esta vinha. Protegei a cepa que a vossa mão direita plantou”. Jesus é a verdadeira vide e nós somos os seus ramos. Deus Pai é o agricultor e trata da sua vinha com amor para que produza muito fruto. Elevamos a alma para Deus e cantemos ou rezemos: “Senhor nosso Deus, fazei-nos voltar, mostrai-nos o vosso rosto e seremos salvos”, refrão do salmo 79, 2ac e 3b, 15-16.18-19, que a Liturgia propõe para Salmo Responsorial.
“Vós esperais a manifestação de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele vos tornará firmes até ao fim, para que sejais irreprensíveis no dia da Sua vinda”, refere a segunda leitura tirada da primeira Epístola de S. Paulo aos Coríntios 1, 3-9. Nesta leitura, S. Paulo convida-nos também a dar graças: “Deus é fiel e chamou-nos a tomar parte em todas as bênçãos espirituais em Jesus Cristo”. Ele é a salvação oferecida a todos os povos. O Advento celebra a vinda do Senhor. De novo a Igreja nos desperta para as exigências da santidade e justiça, condições para acolher o Senhor que vem. Aquele que esperamos já veio, mas a sua presença actua pela expectativa e busca de cada instante. No dinamismo da espera é que o Senhor entra em nossas vidas. Não sou eu que busco o Senhor, mas é Ele que me busca a mim e toma a iniciativa de descer do Pai ao meu encontro. A dificuldade está em eu encontrar a Deus, mas em deixar-me encontrar por Ele.
Advento renova a esperança na revelação de Jesus Cristo em nós e no mundo.Esperamos a revelação total na sua segunda vinda, revestido de glória no Dia do Senhor. Advento é quase incessante e repetido, que falta à nossa esperança para ser posse e plenitude. Advento é aquele mais que nos chama para o encontro definitivo, face a face. Nesta expecativa de encarnação nos encontramos com todas as pessoas e com o Corpo de Jesus Cristo, que tocam em sinais na Igreja e nos sacramentos. Advento é a entrada da Igreja e do cristão no grande discernimento de Jesus Cristo.
“Vigiai, porque não sabeis quando virá o dono da casa”, refere a passagem evangélica deste Domingo, tirada do Evangelho de S. Marcos 13, 33-37. A vigilância é pedida pelo próprio Senhor. Esta vida é como uma longa vigília, com os seus tempos sucessivos, as quatro vigílias da noite referidas no texto, aguardando «o sol nascente» Jesus Cristo, que vem do alto, como recordamos todas as manhãs na oração de Laudes (Benedictus). Vigilância é a atitude cristã, que nos leva ao encontro do Salvador. Vigilantes na fé, o Senhor virá. A esperança nos desperta para O receber, não nos deixando instalar em frágeis seguranças. A nossa esperança é Jesus Cristo. N’Ele nos tornamos firmes e somos “enriquecidos em toda a palavra e conhecimento”. Vigiar é acender a luz das boas obras, caminhar na verdade e na justiça. Só o pecado nos distrai desta espera vigilante e optimista. Vigiar é amar.
Que as vindas de Deus e dos irmãos não nos encontrem a dormir. A Bem-aventurada Virgem Santa Maria, modelo na expectativa de Deus e ícone da vigilância, nos guie ao encontro do seu Filho Jesus, revigorando o nosso amor por Ele.

Diácono António Figueiredo