
Reflexão à Liturgia da Palavra do XXIV Domingo do Tempo Comum Ano A
A história das relações do homem com Deus é a história dos seus perdões. Ele é o Deus do perdão (Neemias 9,17), que tem por ofício perdoar. Somos todos devedores e não temos com que pagar toda a dívida. A paga é o sangue de Jesus Cristo. Fomos reconciliados com Deus gratuitamente, em virtude da redenção realizada no seu sangue. O Pai enviou o Filho ao mundo para o tirar do pecado, rasgando o título da nossa dívida (Epístola de S. Paulo aos Colossences 2,14). A misericórdia do Pai deixou-se vencer e tocar no Filho, que morreu na cruz.
Deus é paciente e não nos paga segundo as nossos culpas (Salmo Responsorial). Não nos julga pelos nossos méritos, mas pela medida da sua grande msericórdia.. A sua paciência não é fraqueza, mas apelo constante à conversão. A dívida do amor que Deus nos tem, supera a dívida da culpa que lhe devemos. Se a nossa dívida é grande, maior é o perdão de Deus. Deus dá mais do que lhe pedimos. Não se contenta em esperar, mas perdoa tudo sem limites. Nem a dívida se acaba, nem o perdão diminui. Porque estamos sempre em dívida, Deus está sempre a perdoar. Perdoa sempre, porque ama sempre. “Onde abundou o pecado, superabundou a graça”. (Epístola de S. Paulo aos Romanos 5,20)
Como S. Domingos Sávio manifestou ser o seu maior desejo, também nós procuraremos rezar como ele: “Antes morrer que pecar”. A única coisa que devemos detestar é o pecado. Tudo e todos os restantes são dignos do nosso amor. Viveremos para amar e perdoar, mesmo diante das dificuldades e ofensas que nos façam. Como Deus nos perdoa, também perdoaremos aos outros.
Para sabermos perdoar de todo o coração a quem nos ofendeu, ou seja, querer e fazer bem a essa pessoa, mesmo não esquecendo que ela nos ofendeu, devemos pedir ajuda a Deus para sabermos perdoar. O perdão aos outros é condição para que Deus nos perdoe, conforme salienta a primeira leitura, proveniente do Livro de Ben-Sirá 27, 33-28, 1-9.
Da meditação da vida de Jesus aprenderemos a ser clementes e compassivos, pacientes e cheios de bondade. Peçamos-Lhe a graça de um coração como o d’Ele. O Salmo Responsorial é o salmo 102 (103), 1-2.3-4.9-10.11-12.
Fazei Senhor que a vossa graça inspire sempre as nossas obras e as sustente até ao fim, para que toda a nossa oração e actividade por Vós comece e em Vós acabe. Em tudo pertencemos ao Senhor e para Ele nos dirigimos. Disto nos fala a segunda leitura, tirada do Epístola de S. Paulos aos Romanos 18, 21-35.
Como Deus te ama, ama tu aos outros à tua volta. “A medida do amor é amar sem medida”, (Santo Agostinho). “E não devias tu compadecer-te”, escutamos no Evangelho. Todos somos devedores de contas mesquinhas que mancham as relações fraternas. Mas “não repares nas ofensas que te fazem”, refere a primeira leitura. “Perdoai e vos será perdoado”. No Reino de Jesus Cristo o perdão é lei; pela medida do nosso perdão seremos perdoados. Se Deus não perdoasse, era porque as nossas recusas de perdão o não consentiam.No divino comércio entre Deus e os homens e dos homens entre si, a moeda corrente é o perdão. É por ele que Deus nos ganha e nós ganhamos a Deus.
“Setenta vezes sete”, aconselha Jesus. O perdão tem exigências: perdoar sempre e tudo. É mandamento do Senhor. Obriga a reprimir cóleras e vinganças, afastar ódios e rancores. O perdão vai mais longe do que a justiça. Pela justiça damos o que é devido, mas pelo perdão damo-nos a nós mesmos. Perdoar pertence à vontade; esquecer, ao pensamento. Só na graça do Espírito perdoamos e somos perdoados. Perdoar não quer dizer aprovar o mal, calar-se perante uma injustiça. Quem perdoa liberta-se. O coração que perdoa vive na paz e na alegria. “Felizes os misericordiosos”.
A Igreja é o perdão de Jesus Cristo e do Pai, comunidade de reconciliados, que vivem em reconciliação permanente. Onde não há perdão não há comunidade de amor, não há Igreja. Viver em comunidade é viver em estado de perdoar sempre. A Igreja foi enviada a perdoar, recebeu de Jesus Cristo o ministério da Reconciliação (2.ª Epístola de S. Paulo aos Coríntios 5,18). A Eucaristia é exigência de perdão. Para comungar Jesus Cristo temos de comungar os irmãos na comunhão fraterna. O amor misericordioso está acima de ritos e holocaustos, é o perfeito sacrifício, oblação imaculada.
Perdoar as ofensas, reconciliar-se com o uirmão é o rito festivo que alegra o coração de Deus. “Deixa a tua oferta e vai primeiro reconciliar-te” (S. Mateus 5,24).
Confiemo-nos à intercessão materna da Bem-aventurada Virgem Santa Maria, Mãe de Deus: que Ela nos ajude a darmo-nos conta de quanto devemos a Deus e a recordá-lo sempre, para que possamos ter o nosso coração aberto à misericórdia e à bondade.

Diácono António Figueiredo

