ENTENDESTES TUDO ISTO?

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Reflexão à Liturgia da Palavra
do XVII Domingo do Tempo Comum Ano A

Diácono António Figueiredo

O tesouro escondido e a pérola revelam-nos o Reino como uma descoberta a fazer. Já o encontraste? É tarefa da vida, profissão de crentes. A Liturgia da Palavra deste Domingo indica que o cristão deve construir a sua vida alicerçada sobre os valores do Reino de Deus. Jesus pede-nos: “Buscai primeiro o Reino de Deus e tudo o mais virá por acréscimo”.

A primeira leitura, tirada do primeiro livro dos Reis 3,5.7-12, apresenta o jovem rei Salomão, modelo de homem sábio, que deseja governar o seu povo com justiça e rectidão. O rei Salomão pediu a sabedoria para saber orientar o seu povo segundo os critérios de Deus. Esta oração agradou de tal modo ao Senhor, que juntamente com a sabedoria , obteve riqeza e longa vida.

Sabemos que o Senhor não abandona os que n’Ele confiam e amam os seus mandamentos. A sua misericórdia estende-se de geração em geração e realiza a nossa esperança, pois a Palavra do Senhor vale mais do que milhóes em ouro e prata. A Palavra do Senhor ilumina e dá inteligência aos simples. Disto nos dá conta o Salmo Responsorial deste Domingo. «Quanto amo Senhor a vossa Lei» é o refrão que iremos cantar ao salmo 118, 57.72.76-77.127-128.129-130.

Deus predestinou-nos para sermos conformes à imagem do seu Filho. Deus escolheu-nos e predestinou-nos antes da criação do mundo para sermos seus filhos adoptivos por Jesus Cristo. Este desígnio de Deus sobre nós vai-se realizando até chegarmos à plenitude na glória. “Nós sabemos que Deus concorre em tudo para o bem daqueles que O amam”. Começa assim a segunda leitura, tirada da Epístola de S. Paulo aos Romanos 8, 28-30. As breves e incisivas palavras desta leitura são das mais belas sínteses paulinas e estão na linha dos ensinamentos centrais de Romanos: a confiança mais absoluta em Deus, que há-de levar a cabo a obra já começada de salvar os seus fiéis.

Com três parábolas, a do tesouro escondido no campo, a do negociante de pérolas e a da rede lançada ao mar, Jesus ensina-nos o caminho da sabedoria para encontrar o Reino dos Céus: semelhante a um pai de família , ele sabe tirar do seu tesouro coisas novas e coisas velhas. “Tesouro escondido”, refere Jesus na primeira parábola tirada da passagem evangélica deste Domingo, respingada do Evangelho de S. Mateus 13, 44-52. Andamos em busca de valores absolutos, que se ocultam por detrás de aparências e bens sensíveis. Não podemos deter-nos em falsos brilhos ou metas provisórias. O Reino de Deus está sempre mais além, onde o esforço nunca se acaba e a busca recomeça. Na pessoa de Jesus e na Sua Palavra revelada se esconde e se revela o Reino que esperamos. Quem o quiser encontrar, busque-o na Igreja, fiel dispensadora dos tesouros de Jesus Cristo. A graça é a pérola de grande valor, a insondável riqueza de Jesus Cristo. Um tesouro nos atraiu e justificou para sermos glorificados, confotrmes à imagem do Filho de Deus.

Mas o Reino dos Céus tem rosto próprio, diferente. Não é tesouro inacessível, mas está dentro de nós, ao alcance de todos. Só é tesouro escondido para quem não o procurar. Deus toma a iniciativa e vem ao nosso encobntro. O Reino dos Céus não é tesouro que buscamos, mas tesouros que nos busca. Vem em frágeis aparências, tem caminhos desconcertantes. Como o negociante e o lavrador da paránola, buscamos uma coisa e encontramos outra. No interior de sobras e rotinas há tesouros por descobrir.

“O homem que o achou tornou a escondê-lo”, revela Jesus. O Reino dos Céus revela-se no imprevisto. Tudo acontece como por acaso, sem previsões nem projectos. Vem na humildade e pobreza do que acontece sempre. Os imprevistos do homem são os projectos de Deus, corrigindo e completando a nossa obra. Mas o cristão é mergulhador de profundidades, com a rede que vai ao fundo. O melhor das coisas e da vida está dentro, em desafio de comunhão e intimidade. Tenho de habitar no interior, minha morada escolhida, onde se revelam tesouros e o Reino cresce.

“Foi vender tudo quanto possuía”, diz Jesus na parábola. A sabedoria do Reino impõe-nos uma hierarquia de valores. Tudo é perda e lixo, em comparação com o conhecimento de Jesus Cristo, (Epístola de S. Paulo aos Filipenses 3,8). É a grande sabedoria, maior que a de Salomão (1.ª leitura). Quando o Reino me possuir, tudo o mais me será dado por acréscimo. Só é bem total e definituivo aquilo pelo qual se dá tudo. A vida cristã é todos os dias perder, todos os dias encontrar. Nos espaços ocultos de renúncias e despojos há um Reino que se avizinha e nos espera.

“Entendestes tudo isto”, pergunta Jesus. Para entrar no Reino é preciso sabedoria e discernimento da Palavra. Coisas novas e coisas velhas são o Antigo e o Novo Testamento, donde o Espírito vai tirando a eterna novidade, que dá sentido e resposta aos tempos e à vida. O cristão é o douto escriba, que sabe discernir os planos de Deus em tudo o que acontece. Entender é acreditar que o Reino cresce por entre contradições. Redes vazias, buscas em vão, tudo é crescer.

Quem ama, tudo entende e tudo lhe sairá bem. Entendestes? A Bem-aventurada Virgem Santa Maria nos ajude a percorrer o caminho que o Senhor nos mostra no Evangelho deste dia, para melhor entendermos a necessidade da procura incessante do Reino dos Céus.